O presidente Lula (PT) reagiu com indignação à recente declaração de Donald Trump, que acusou o Judiciário brasileiro de promover “caça às bruxas” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), seus filhos e aliados. Lula não hesitou em classificar a fala como ofensiva à soberania nacional e retrucou dizendo que não aceitaria interferência e que Trump deveria “cuidar dos problemas do seu país”. Soa firme, mas é é incoerente.
Isso porque, dias antes, o próprio Lula fez exatamente o que agora condena: em visita à Argentina, saiu em defesa da ex-presidente Cristina Kirchner, condenada por corrupção e acusou o Judiciário argentino de perseguição política. Ou seja, acusou, em solo estrangeiro, outro país soberano de manipular suas instituições de Justiça.
A incoerência é gritante. Lula não apenas interferiu nos assuntos internos da Argentina, como substituiu a diplomacia por militância ideológica. Sua lógica é simples: se o investigado ou condenado for de esquerda, trata-se de perseguição; se for de direita, trata-se de Justiça em ação. É um padrão moral seletivo, indigno de um chefe de Estado.
Mais do que hipocrisia, o comportamento de Lula expõe um problema de fundo: a confusão entre Estado e partido, entre governo e militância, entre diplomacia e ideologia. O presidente, ao invés de representar os interesses do Brasil com equilíbrio e responsabilidade, segue agindo como se estivesse em um palanque permanente — um palanque onde só cabem aliados e onde o mundo se divide entre “companheiros injustiçados” e “inimigos do povo”.
A crítica que Lula fez a Trump é até justa, porém, a defesa que fez de Cristina é vergonhosa. E juntas, essas duas atitudes anulam uma à outra. Porque, no fim, o que se vê é um presidente que exige respeito às instituições brasileiras, mas não respeita as dos outros países quando os interesses ideológicos dele estão em jogo.
Lula quer ser respeitado como estadista, mas age como um militante em missão internacional. Quer ser símbolo da democracia, mas relativiza as instituições quando elas contrariam seu campo político. Exige soberania, mas só quando lhe convém. E ao fazer isso, enfraquece a própria autoridade moral.
A soberania, a democracia e a Justiça não podem ser princípios de ocasião. Ou se defende sempre — e com coerência — ou se transforma em discurso vazio e sem, a mínima, credibilidade.
