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ANÁLISE: Cassação de Deltan é vingança — e um golpe na democracia

Ao cassar o mandato do deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR) na noite desta terça-feira, 16, o TSE não fez Justiça. Serviu, em vez disso, como instrumento de vingança de uma casta política que viu seus esquemas sujos desnudados pela Operação Lava Jato e agora procura, aos poucos, reescrever a história, fingindo que o petrolão não foi um gigantesco esquema de corrupção, mas apenas o delírio de alguns juízes, procuradores e policiais federais.

Ao longo dos últimos anos, ministros de tribunais superiores e caciques de vários partidos atingidos pela Lava Jato acusaram Deltan Dallagnol de utilizar a operação como instrumento político. Disseram que, se ele desejava fazer política, deveria se candidatar a um cargo eletivo. Dallagnol o fez. E venceu. Em situações normais, caso encerrado.

Mas eis que o TSE profere, unanimemente, uma decisão que tem a lógica dos contos fantásticos.

Em seu voto, seguido pelos outros seis integrantes da corte, o ministro Benedito Gonçalves parte do princípio que em novembro de 2021, quando deixou o Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol tinha pleno controle sobre fatos que só aconteceriam vários meses depois: o registro de sua candidatura para concorrer ao cargo de deputado federal; a disputa das eleições de 2022; e a vitória com 344 mil votos de eleitores paranaenses.

Dono do futuro, ele teria abandonado sua carreira no MPF para impedir que procedimentos que questionavam sua atuação funcional viessem a se converter, quem sabe, em processos administrativos disciplinares (PAD) – fato que o tornaria inapto a disputar eleições.

O ministro Benedito Gonçalves reconhece que a abertura dos PAD era somente uma hipótese: os procedimentos existentes contra Dallagnol “poderiam vir a ser convertidos ou dar azo a processos administrativos disciplinares”. Para o ministro, no entanto, a mera possibilidade basta para sacramentar que o ex-procurador tentou fugir da lei.

Segundo a lógica do TSE, em outras palavras, Dallagnol pediu demissão para evitar processos que talvez acontecessem, e participar de eleições que ainda estavam distantes vários meses no futuro. São conjecturas em cima de conjecturas. Futurismo em cima de futurismo. É difícil imaginar uma sentença judicial assentada em bases mais frágeis.

Ou melhor: é difícil imaginar uma sentença mais contrária à jurisprudência estabelecida do próprio TSE, que costuma – ou costumava – interpretar regras de inelegibilidade de maneira restritiva, para proteger o direito político de quem deseja se candidatar.

O Tribunal Regional Eleitoral, que havia dado ganho de causa a Dallagnol, e cuja sentença foi reformada agora pelo TSE, partiu de princípios exatamente contrários: baseou-se num fato concreto e incontestável para decidir. Como no momento em que deixou o MPF Dallagnol não respondia a nenhum PAD, ele estava livre para concorrer às eleições. Ponto final.

Há ocasiões em que políticos muito votados perdem o mandato porque as provas de que venceram de maneira ilegal são irrefutáveis. Este não é um desses casos. Os votos dos 344 mil eleitores de Deltan Dallagnol estão sendo desconsiderados com motivos frágeis. E a mensagem não poderia ser pior. Nas palavras do procurador Wellington Saraiva: “A sociedade deve refletir sobre que futuro a aguarda em um cenário no qual réus poderosos são absolvidos, apesar de haver provas, e os membros do Ministério Público que os acusam são punidos”.

O Antagonista

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