O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), fez duras críticas ao governo federal nesta terça-feira (28), ao afirmar que o estado teve três pedidos de apoio das Forças Armadas negados durante operações de segurança. A declaração foi dada em coletiva de imprensa sobre a ação policial nos complexos da Penha e do Alemão, que resultou em dezenas de mortes e prisões.
“Já pedimos os blindados algumas vezes e todos foram negados. Falaram que tinha que ter GLO (Garantia da Lei e da Ordem), porque o servidor que opera o blindado é federal. E o presidente é contra a GLO”, disse Castro.
O governador classificou a situação como um “abandono” do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e afirmou que o Rio está “sozinho” no enfrentamento ao crime organizado.
“Não temos ajuda das forças de segurança federais, nem Defesa. É o Rio de Janeiro sozinho. É muito fácil criticar o governador quando o estado está excedendo suas competências, mas a realidade é essa: estamos sozinhos.”
Operações sem apoio militar
Segundo Castro, a ausência de cooperação entre os governos estadual e federal tem dificultado o avanço das ações de segurança. Ele afirmou que o Rio enfrenta barricadas, drones armados e criminosos fortemente equipados, mas sem o suporte militar que considera necessário.
“O que talvez esteja acontecendo é uma falta de foco e interesse na segurança pública. Essa falta de priorização faz com que a gente não tenha elementos fundamentais para esse combate”, declarou.
O governador tem cobrado do Planalto a liberação de veículos blindados e a participação de tropas federais em operações conjuntas. Segundo ele, o governo Lula se recusa a decretar GLO, instrumento constitucional que autoriza o uso das Forças Armadas em ações de segurança interna.
A última vez que uma GLO foi aplicada no Rio de Janeiro ocorreu em 2018, durante o governo Michel Temer, quando as Forças Armadas assumiram temporariamente o comando da segurança pública no estado.
Críticas ao STF e à ADPF 635
Durante a coletiva, Cláudio Castro também voltou a criticar a ADPF 635, decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que restringiu operações policiais em comunidades durante a pandemia de Covid-19.
“Hoje, os criminosos têm drones com bombas e armas de guerra, e ninguém se manifesta”, afirmou.
Na avaliação do governador, a limitação imposta pelo Supremo abriu espaço para o avanço das facções criminosas e a migração de grupos de outros estados para o território fluminense.
“Essa foi uma das maiores tragédias da segurança pública fluminense. A ADPF criou um vácuo que o tráfico preencheu”, declarou.
A decisão do STF, relatada pelo ministro Edson Fachin, determinou que operações policiais em favelas só poderiam ocorrer em casos excepcionais, mediante comunicação prévia ao Ministério Público e adoção de medidas para preservar moradores e agentes públicos.
Balanço da operação na Penha e no Alemão
A operação realizada nesta terça-feira nos complexos da Penha e do Alemão, coordenada pelas polícias Civil e Militar, resultou em 81 prisões e na apreensão de 46 fuzis.
De acordo com o balanço parcial, 64 pessoas morreram, incluindo dois policiais civis. A Secretaria de Segurança Pública informou que o objetivo da ação era desarticular facções ligadas ao tráfico de armas e drogas.
Cláudio Castro classificou a operação como “fundamental” e exaltou o trabalho das forças estaduais.
“Depois de cinco anos de limitações, as nossas polícias, com muita coragem, estão enfrentando o crime. Eu tenho orgulho de cada policial que foi para a rua hoje”, afirmou.
Apesar disso, o governador evitou divulgar o número total de mortos e feridos, concentrando-se nas críticas à falta de apoio federal.
“O governo federal não prioriza o combate ao crime. Falta coordenação, falta estratégia e, principalmente, falta vontade política”, disse.
Impasses entre Rio e Brasília
As declarações de Castro marcam mais um capítulo da tensão política entre o Palácio Guanabara e o Palácio do Planalto. O governador, filiado ao Partido Liberal (PL), vem mantendo um discurso de confronto com o governo Lula em temas de segurança e infraestrutura.
Em 2023, o então ministro da Justiça, Flávio Dino, havia autorizado o envio da Força Nacional de Segurança Pública para o Rio, mas, segundo Castro, o apoio foi “limitado e simbólico”.
“Mandaram a Força Nacional para patrulhar estrada. Não é lá que o crime está. O crime está dentro das comunidades, onde o Estado precisa estar presente”, criticou.
Em resposta, fontes do governo federal afirmam que o Rio de Janeiro possui autonomia para coordenar suas operações policiais, e que a GLO só é autorizada em situações de grave perturbação da ordem pública, o que, segundo o Planalto, “não se aplica ao momento atual”.
Contexto político e institucional
O embate ocorre em meio à pressão por resultados na segurança pública fluminense, uma das principais bandeiras de Cláudio Castro. O estado registra aumento das disputas entre facçõese expansão do poder de milícias na região metropolitana.
Além disso, o Rio enfrenta críticas de organizações de direitos humanos sobre a letalidade das operações policiais. Segundo o Instituto Fogo Cruzado, as ações de 2025 já registram mais de 600 mortes em confrontos com forças de segurança, um dos índices mais altos do país.
O governador, contudo, tem reiterado que “as polícias não vão recuar”.
“O Rio não pode mais se esconder atrás de decisões ou da falta de apoio. Nós vamos enfrentar o crime, com ou sem ajuda federal”, concluiu.
Repercussão e próximos passos
A escalada de declarações de Cláudio Castro deve acirrar o debate sobre a política de segurança pública no país e o papel da União no apoio aos estados.
Enquanto o Planalto resiste a autorizar o uso das Forças Armadas, o governo fluminense promete intensificar operações e pressionar por mais recursos federais.
O impasse reforça a fragmentação institucional no enfrentamento ao crime organizado e evidencia o conflito político entre o governo Lula e um dos principais governadores aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) — em um momento em que a segurança pública volta ao centro da agenda nacional.
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